A terapia de reposição hormonal (TRH) na menopausa, em mulheres com histórico de câncer de mama, continua sendo um dos temas mais complexos e discutidos na endocrinologia ginecológica. Durante muito tempo, prevaleceu uma abordagem extremamente conservadora, centrada no medo da recidiva. No entanto, novas evidências e diretrizes permitem hoje uma avaliação mais personalizada e equilibrada.
Entendendo a complexidade: o papel da biologia tumoral
Nem todos os cânceres de mama respondem da mesma forma aos hormônios. Por isso, é essencial compreender a histologia e o perfil molecular do tumor:
Subtipo tumoral | Receptores hormonais | Implicação para TRH |
Carcinoma ductal infiltrante RH+ | ER+/PR+ | Contraindica TRH sistêmica |
Carcinoma HER2+ puro | Sem expressão hormonal | Avaliação caso a caso |
Triple-negative (ER-, PR-, HER2-) | Ausência de receptores | Maior abertura para discutir TRH |
Carcinoma in situ (DCIS/LCIS) curado | Dependente do subtipo | Pode ser considerado |
O que dizem as principais evidências?
- A metanálise CGHFBC publicada no The Lancet (2019) apontou aumento no risco de recidiva com o uso contínuo de TRH combinada em mulheres com câncer RH+.
- O estrogênio isolado demonstrou risco bem menor, principalmente em mulheres histerectomizadas.
- Uma revisão integrativa publicada em 2025 (Acervo Saúde) mostrou que a duração e o tipo de hormônio utilizado influenciam diretamente esse risco.
Novas diretrizes: mais individualização
As diretrizes NICE (2024) e BMS (2024) propõem uma abordagem mais flexível:
- A TRH sistêmica permanece contraindicada em cânceres de mama RH+ ativos ou recentes.
- Pode ser discutida em casos de câncer triple-negative ou HER2+, curado há muitos anos, desde que com aval do oncologista e equipe especializada.
Estrogênio vaginal: opção segura?
- Segundo NICE e BMS, o estrogênio vaginal de baixa dose não aumenta o risco de recidiva em mulheres com câncer de mama RH+.
- Um estudo apresentado na ASCO 2025 mostrou que mulheres com >65 anos que usaram creme vaginal apresentaram redução da mortalidade.
- Pode ser indicado para sintomas urogenitais como secura vaginal, dispareunia e infecções urinárias recorrentes, sempre com acompanhamento multidisciplinar.
Dicas práticas para a conduta clínica
- Câncer de mama RH+ ativo ou recente: contraindicação formal à TRH sistêmica.
- Triple-negative, HER2+ puro ou DCIS curado: podem permitir avaliação individualizada.
- Estrogênio vaginal local (baixa dose): seguro mesmo em RH+, com aval oncológico.
- A decisão terapêutica deve ser compartilhada e multidisciplinar, considerando riscos, benefícios e qualidade de vida da paciente.
Referências:
- NICE. Menopause: identification and management (NG23). 2024.
- British Menopause Society (BMS). Consensus Statement, 2024.
- The Lancet. Type and timing of menopausal hormone therapy and breast cancer risk. 2019.
- Acervo Saúde. Terapia hormonal na menopausa e câncer de mama: revisão integrativa. 2025.
- Reuters Health. Older breast cancer patients using estrogen cream live longer. 2025.
- The Times. Menopausal cancer survivors offered HRT under new guidance. 2025.

Artigo escrito pelo Diretor Científico da SottoPelle Brasil, Dr. Francisco Tostes.